L’Or de J’adore,
O (re)nascimento
de um ícone

EMBLEMA ETERNO DOS PERFUMES DIOR, J’ADORE GANHA UMA NOVA INTERPRETAÇÃO CONCEBIDA POR FRANCIS KURKDJIAN, DIRETOR CRIATIVO DOS PERFUMES DA MAISON. UM PODEROSO GESTO INAUGURAL QUE DEU VIDA AO L'OR DE J'ADORE, ONDE HOMENAGEM E LIBERDADE CRIATIVA SE ENCONTRAM. ENTREVISTA POR MARIE AUDRAN.

F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P14D L’or Fleurs
F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P17E Pétale Or_L4_F39

Marie Audran: J’adore se tornou um mito, um perfume lendário… O que este ícone Dior representa para você?

Francis Kurkdjian: Ele faz parte de mim, da minha essência, pois testemunhei sua criação em 1999 por sua autora, Calice Becker. Eu acompanhei todas as etapas de sua gênese pois fazia parte da mesma equipe, em Nova Iorque. Eu era um jovem perfumista, formado há três anos e nos apoiávamos muito, com um espírito combativo extraordinário para vencer esse grande desafio. Restabelecer sua historicidade original foi muito importante para mim, assim como com o legado da Dior. Cada época tem seu ícone: J’adore é o mais importante dos buquês, insuperável e que definiu o arquétipo da floralidade. Ele nunca foi superado. É um verdadeiro sucesso atemporal, que nunca sai de moda, é a mais pura essência da Dior.

MA: Como explicar sua aura incomparável?

FK: Os grandes clássicos possuem a capacidade de serem, de uma forma olfativa, a quintessência de um estilo. O tema floral está associado à feminilidade, à mitologia da mulher. J’adore sintetiza esse espírito, sendo ao mesmo tempo vanguarda, ele é uma revolução floral após Poison, encarnado por Charlize Theron de maneira inédita, icônica. J’adore adicionou textura e rastro, e é isso o que representa um grande sucesso: uma bela ideia criativa baseada em uma grande capacidade técnica. Isso é algo indissociável. E um perfume, não é apenas uma fragrância, é também um nome. A expressão “j’adore!” se tornou universal, assim como “enchanté!”.

MA: Desde seu retorno à Maison como Diretor Criativo de Perfumes, L’Or de J’adore é a sua primeira reinterpretação, imaginada como uma quintessência refinada. Por que J’adore?

FK: Na Dior, o motivo olfativo que melhor define a Maison são as flores. A história de J’adore possui uma trama muito potente. A grande sorte de estar na Dior é poder revisitar esses ícones, esses arquétipos importantes da perfumaria que marcaram as épocas. L’Or de J’adore apresentou esse desafio: até onde conseguimos ir na visão e estilo criativo de Calice Becker para criar um extrato de perfume com uma dualidade complementar, entre frugalidade e voluptuosidade? L’Or de J’adore possui justamente esse aspecto mais sensual, mais carnal, mais voluptuoso.

DIOR_PORTRAIT_040_0386_BLACK_SHIRT_R1

JULIA NONI PARA PERFUMES CHRISTIAN DIOR

“A quintessência de J’adore existe. L’Or de J’adore vai ao essencial, exalta a beleza das flores através de um concentrado suave e iluminado. L’Or de J’adore, são essas flores.

– FRANCIS KURKDJIAN

MA: Você disse que com L’Or de J’adore passamos do impressionismo para a arte abstrata...

FK: Exatamente. As obras de Damien Hirst me inspiraram enormemente, passando do pontilhismo a uma abstração, uma pincelada extremamente aumentada, grossa, desproporcional. Temos algo similar com este novo J’adore, que encarna a grandiosidade da Dior. É como se derretêssemos o ouro para eliminar suas impurezas, como por exemplo a sua nova embalagem, onde o frasco e a tampa transformam-se em um, através de uma linha lisa e contínua. Este projeto possui uma coerência infinita. Mantivemos o acorde, mas deixamos a fórmula mais concentrada, a reforçamos, a pixelizamos em formato extra grande.

MA: Qual foi a sua principal inspiração?

FK: L’Or de J’adore, representa as flores e sua suprema riqueza. Queríamos dar uma nova sensação a esse motivo floral, uma expressão certamente mais carnal, solar, iluminada, remetendo ao brilho. Para mim, L’eau de parfum era como um grande buquê homenagem para Madeleine, a mãe de Christian Dior, apaixonada por jardins, uma ode à Belle Époque com uma constelação de conexões com o legado Dior. Com L’Or de J’adore, eu tentei criar novamente os códigos de hoje e de amanhã para as próximas décadas.

MA: Vemos que L’Or de J’adore também expressa essa maneira de ser particular à Dior de “respeitar a tradição e ousar a insolência”. Como essa ousadia surge neste projeto?

FK: Aqui a insolência representa pegar um ícone que parece intocável pelo seu simbolismo, mas também pelo seu grande savoir-faire, a maneira não figurativa como seus ingredientes florais são paralelamente dispostos. É um grande buquê de flores pontilhistas onde nenhuma flor em particular se sobressai, como em um quadro impressionista. Por isso ele é extraordinariamente virtuoso. Citar apenas uma flor seria uma injustiça com as outras: a potência de J’adore é justamente esse entrelaçamento infinitamente subtil. Eu (apenas) dei um zoom, lhe homenageando sem desfazer sua trama. Christian Dior dizia que suas modelos eram “todas as mulheres do mundo”. Graças à magia e à potência intacta de J’adore, eu desafiei a mim mesmo dizendo que era a minha vez de usar “todas as flores do mundo”. E com toda a audácia, a abundância e o rigor que representam o espírito Dior, L’Or de J’adore representa todas as flores do mundo. E seu frasco é a ânfora, as curvas femininas e também... o detalhe dos balaústres dos balcões parisienses!

F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P02 H Hero crop fond blanc_SW_F39

MA: 'Na sua opinião qual é o papel do perfume? Um impulso vital, uma dose extra da alma?

FK: O paladar, o olfato nos diferenciam fundamentalmente, universalmente das máquinas. “Sinto, logo existo”, o olfato é a primeira memória que nosso corpo consolida desde a fase fetal, ela nos protege do perigo e faz com que a gente se “sinta” vivo. Casanova brilhantemente resumiu a característica vital, existencial desse sentido essencial: “Eu sei que eu existi, e tenho certeza porque eu senti, e também sei que não existirei mais, quando não sentirei mais. Se, por acaso, eu ainda sentir após minha morte, não terei mais dúvidas, mas certamente desmentiria qualquer pessoa que afirmasse diante de mim que eu estava morto1.” A memória olfativa tem esse incrível poder, o de proporcionar o sentimento de viver e ter existido.

MA: Como você descreveria seu processo criativo?

FK: Procuro fazer o mais simples possível, foi desta forma que aprendi a arte da perfumaria, como uma busca eterna pelo puro. Diante de cada uma das minhas fórmulas, eu me pergunto regularmente como posso simplificar, sem trair o sentido da mensagem. Com este novo J’adore, “mais simples” seria impossível, pois “reduzimos” permanentemente até chegar na essência de J’adore. Uma criação deve ter este propósito para perdurar. Ela não pode se tornar seca, árida, sem alma. O mais importante é desaprender, esquecer o que já sabemos para ir em direção ao desconhecido, ao passo que conservamos a tecnicidade adquirida. Como diz perfeitamente Soulages: “A abordagem do artista é profundamente diferente da do artesão, o artesão que vai em direção a um objeto que ele conhece, que ele sabe fazer (...). O artista, com uma intuição do que as técnicas camuflam, mais do que com o conhecimento adquirido, vai em direção ao que ele não sabe2.” Para me aproximar dessa abundância quase pictórica eu precisei mergulhar de cabeça em sua fórmula, macerar sua riqueza para extrair sua essência e criar uma nova sensualidade, imediatamente atraente. Um J’adore curvilíneo e sedutor como um ombro nu...

1. Giacomo Casanova, Story of My Life.

2. Entrevista de Tatiana Autajon, Daniel Abadie (dir.) Le cadre et le socle dans l’art du xxe siècle, Universidade de Bourgogne, Dijon, e Museu Nacional de Arte Moderna, Centro Georges-Pompidou, Paris, com o auxílio do Centro nacional de artes plásticas, 1987.
F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P14D L’or Fleurs
F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P17E Pétale Or_L4_F39
DIOR_PORTRAIT_040_0386_BLACK_SHIRT_R1
F607 J'ADORE RENO L'OR 23 P02 H Hero crop fond blanc_SW_F39